1
Somam-se os dias plenos deste esperar por ti,
cadência das palavras que à minha boca alteias,
imagens de uma vida por capitais e aldeias,
pelas urbes, descampados, tão longe e por aqui.
Regresso ao meu sossego, a Monte Boi esquecido,
retomo a escrita e os livros, distante de elogios,
e os poemas, singelos, fazem lembrar os rios
deslizando, em silêncio, murmúrios ao ouvido.
Somam-se os dias plenos, replectos de palavras,
vagueando sozinho por entre estes vergéis…
regresso à aldeia e ponho os sonhos nos papéis
Ao vosso aplauso…antes o odor das ervas bravas.
Casa
26 maio 16
10,00h
2
Ó Monte Boi; retiro com o céu à minha altura.
As nuvens, se quisesse, tocava com os dedos.
Ninguém mora nas casas, os templos dos segredos
da história de outras vidas, constante formosura.
Mirante que me oferece o Sul, numa bandeja,
este vasto horizonte que me avizinha o mar…
e eu esqueço o tempo e fico… e fico a contemplar
a beleza do Algarve que é tanta…que sobeja.
26 maio 16
10.10h
3
sou caçador das sombras, desenhadas na cal,
consoante a incidência do sol imperador
ou sanguínea visão de uma roseira em flor;
gerânios, estas malvas flamejantes de ardor
que oferece, ao meu olhar, infantil arraial.
O branco, azul, vermelho da pedra grés às portas,
nos poiais que prefiro aos pedantes degraus…
e ando ao sabor da vida já quando, às horas mortas,
a aldeia é a ternura… do abraço dos meus pais.
26 maio 16
11 h
4
Perguntam-me, porém, da minha placidez,
De onde me vem a paz com que a tristeza iludo.
Faço silêncio e digo: -A placidez? De tudo
O que daqui avisto; rosmanos e marés,
E a madressilva e a prata das tenras oliveiras,
as irmãs primitivas, anãs, as zambujeiras
E os carrascos e os funchos, das orquídeas esquivas,
Batatas albarrãs das cores de azul mais vivas
nascendo nos valados De pedras milenares,
alheias à mudança alheias ao progresso…
mendigo a placidez que, à vida, mais não peço,
tal como é mendicante o musgo dos valados…
A minha placidez? Meus olhos sossegados
Pelas veredas estreitas, Nas nuvens, pelos ares.
26 maio 16
12,09h
5
Regresso à minha alma como, ao final da tarde,
De volta a passarada ao lar, no meu jardim;
Pináculos de ciprestes a fervilhar de alarde
Enquanto a brisa asperge perfume do jasmim.
Também sou viandante de rotas que não digo,
Derrotas das quais fiz meus versos vencedores
E venço as dores… por ser, por estar de bem comigo,
No estado natural, irmão das simples flores.
Regresso à minha alma, ao ninho amornecido
Pelo sol do antigo sonho, macio de antigas penas,
Que apenas me descrevo num céu desconhecido
E acordo… ao romper de alva, às horas mais serenas.
Casa
26 maio 16
17.42 h